quarta-feira, agosto 30, 2006

IN MEMORIAM

Não sei se foi a ida até a Igreja depois de tanto tempo sem pôr os pés em templo nenhum, mas desta vez me senti bem no local. Talvez por causa da espontânea vontade que me trouxe até ali, (co)movida pela morte recente de uma colega do curso de informática, a Sabrina. Não me aproximei muito dela em vida, apenas trocamos palavras fortuitas entre um intervalo e outro das aulas. Entretanto, desde o início, seu semblante havia me marcado mais que qualquer situação no convívio frio do cotidiano. Quando a conheci, ela estava de costas sentada na primeira fila da sala, bem defronte à lousa. Devia ser aluna aplicada, julgava eu. Seus longos cabelos cacheados, os largos quadris, desenhavam-me uma garota bonita. Ao levantar, virou o rosto, assim podendo eu logo constatar certa beleza. Não a que imaginava do físico, mas em sua áurea cálida e silenciosa. Identifiquei-me com sua reserva. Resguardava-me um tanto também por isso.

Semana passada uma outra colega, Emília, essa sim bem chegada a ela, fez com que eu reparasse em sua ausência. Disse-me que Sabrina estava há dias internada em uma clínica com problemas no sangue. Anemia profunda. De chofre, comecei a rememorar uma ocasião em que ela aparentava cansaço extremo, queixando-se para nós no banheiro da pressão baixa, com aquela palidez encerando o rosto. Até comentei com minha mãe na hora do almoço, enquanto despejava feijão em meu prato, sobre a alimentação boa para quem era anêmico, citando o caso da amiga doente.

Na aula seguinte, a notícia. O professor, que costumava escrever no quadro um "Boa Tarde", não pôs dessa vez. Estranhei. Na verdade, estranhei desde que cruzamos pelos corredores e algumas pessoas, com ele, não responderam ao meu cumprimento, meio cabisbaixas. Ele falou, secamente, depois que nossa parceira estava morta. A turma estava em silêncio, ao contrário dos outros dias. Não concluimos as atividades, so alunos foram liberados mais cedo e a Internet nos laboratórios disponibilizada. Fiquei sentada num canto, com uma bola de choro guardado na garganta, olhando para o nada.

7 dias transcorreram sutis, quando Emília me chamou à missa. Disse que iria. Era comecinho de noite, havia chegado no fim, quando a avistei em prantos andando ligeiro de volta para casa. Chamei por seu nome e dei-lhe um forte abraço. Ela me tomou com delicadeza as mãos, levando-me para conhecer a família de Sabrina. Mais abraços, pois não sabia o que dizer. Fui apresentada às tias, ao noivo... Lembro que Sabrina havia levado um bolo feito por ele numa festinha que organizamos antes das férias de Julho. Julho foi também o mês de aniversário dela, dia 15 completou 24 anos. De vida. O mais forte foi ter visto sua mãe na porta da Igreja. Nossa, como se pareciam! Ela não tirou os olhos de mim por um bom momento. Talvez vislumbrasse a filha através da minha timidez. Despedidas...

Adentrei lá, suave, pelo corredor entre os bancos. Aproximei-me mais do altar, quando a luz vermelha indicando uma presença me impeliu a ajoelhar. Olhos molhados, mãos postas, uma singela oração à alma dela. Agradeci por estar viva, rogando benesses, bençãos ao por vir. Sai de lá em paz, ainda embalada pelo som de um cravo que tocava a Ave Maria.

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