terça-feira, julho 25, 2006

OCIUM OPERANDI


O sono me draga na constância do meu nada fazer. Opero outras coisas, as artes que cabem no meu todo tempo disponível. Sem elas, cansaria do meu cansaço ainda mais. Crio e recrio a meu bel prazer, satisfaço meu radar com a TV quando há cultura, seleciono o material a ser digerido, filmes, livros, jornais, recortes e colagens. Tudo reciclado. Terapias que mantém minha oficina do diabo na ativa, enquanto os professores da universidade onde estudo não saem da greve em razão do baixo salário, enquanto meu universo não resolve fazer greve de fome de mim mesma. Internet, 3 Blogs a administrar, Google para pesquisar a palavra do dia feito um oráculo. Ouço MP3, baixo outros mais, enjôo rápido e tudo passa devagar. Se estivesse trabalhando duro reclamaria do mesmo jeito, clamaria por férias, ar puro, silêncio. Passo essas férias forçadas na urbe, em cinema, teatro, biblioteca, trancafiada no quarto, escrevendo, madrugando, enlouquecendo sozinha. Queria ir para o campo, para alguma praia deserta com o meu amado, abraçar o vento, gritar palavrões ao relento, só para preencher esse vazio oco redundante. Areia nos bolsos, resquícios do verão passado - em branco. Se o relógio parasse, se o mundo estacionasse numa vaga espaçosideral por um dia, pra eu descer, repensar meus atos e os meus desatos, enxugar o suor do rosto, apagar as olheiras, engatilhar uns feixes de neurônios mortos, enxagüar a alma, calar a boca dos que falam demais, amputar as pernas dos minutos que correm tanto. Se estamos à toa, queremos movimento, se nos movemos, almejamos estaticidade. Nada sabemos, por isso acabamos sem fazer nada, idem, por mais ocupados que estejamos. Rotina é o que mata, na verdade, seja ela de folga ou de trabalho. O lance é inventar história pra sair da monotonia. Bem, mas isso eu faço literalmente, aliás, meu passatempo preferido. Ser criativo é a única maneira de adornar o ócio e de viver alguma felicidade ainda... Ah, chega, já cansei!! Vou sair pra tomar um Schopp... Um Schopp, por favor... Um Schopenhauer:

"O panorama mais amplo mostra-nos a dor e o tédio como os dois inimigos da felicidade humana. Observe-se ainda: à medida que conseguimos afastar-nos de um, mais nos aproximamos do outro, e vice-versa; de modo que a nossa vida, na realidade, expõe uma oscilação mais forte ou mais fraca entre ambos. Isso origina-se do facto de eles se encontrarem reciprocamente num antagonismo duplo, ou seja, um antagonismo exterior ou oubjectivo, e outro interior e subjectivo. De facto, exteriormente, a necessidade e a privação geram a dor; em contrapartida, a segurança e a abundância geram o tédio. Em conformidade com isso, vemos a classe inferior do povo numa luta constante contra a necessidade, portanto contra a dor; o mundo rico e aristocrático, pelo contrário, numa luta persistente, muitas vezes realmente desesperada contra o tédio. O antagonismo interior ou subjectivo entre ambos os sofrimentos baseia-se no facto de que, em cada indivíduo, a susceptibilidade para um encontra-se em proporção inversa à susceptibilidade para o outro, já que ela é determinada pela medida das suas forças espirituais. Com efeito, a obtusidade do espírito está, em geral, associada à da sensação e à ausência da excitabilidade, qualidades que tornam o indivíduo menos susceptível às dores e aflições de qualquer tipo e intensidade. Por outro lado, dessa mesma obtusidade espiritual resulta aquela vacuidade interior estampada num sem-número de rostos, que se trai por uma atenção sempre activa, dada a todos os acontecimentos do mundo exterior, mesmo os mais ínfimos. Tal vacuidade é a verdadeira fonte do tédio e leva sempre a ansiar por estímulos exteriores, para colocar o espírito e a mente em movimento mediante qualquer meio. Sendo assim, na escolha de tais meios, essa vacuidade não é fastidiosa, como atestam a mesquinhez das distracções às quais as pessoas recorrem, o tipo de sociabilidade e conversação que procuram, bem como o grande número de ociosos e curiosos. É principalmente dessa vacuidade interior que se origina a busca por reuniões, distracções, divertimentos e luxo de todo o tipo, busca que conduz tantas pessoas à dissipação e depois à miséria. Nada preserva tanto desse desvio quanto a riqueza interior, a riqueza do espírito. Pois esta, quanto mais se aproxima da eminência, menos espaço deixa para o tédio. A actividade inesgotável dos pensamentos, o seu jogo sempre renovado diante dos diversos fenómenos do mundo interior e exterior, a força e o impulso para combinações sempre variadas com eles, colocam a cabela eminente, descontados os momentos de cansaço, totalmente além do alcance do tédio. Mas, por outro lado, a inteligência intensificada tem por condição imediata uma sensibilidade elevada, e por raiz uma maior veemência da vontade, portanto da passionalidade. Da união daquela com estas resulta, então, uma intensidade muito maior de todos os afectos e uma sensibilidade elevada em face das dores espirituais e mesmo físicas, bem como uma impaciência maior diante de qualquer obstáculo, ou até de simples incómodos."

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